O ex-ministro José Dirceu divulgou na tarde de hoje (8) uma nota criticando a decisão do relator do mensalão, Joaquim Barbosa, de ordenar aos réus do caso que entreguem seus passaportes. A ordem partiu do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) na noite de ontem. "A decisão do relator Joaquim Barbosa (...) é puro populismo jurídico e uma séria violação aos direitos dos réus ainda não condenados, uma vez que o julgamento não acabou e a sentença não transitou em julgado", disse Dirceu na nota.Para o ex-ministro da Casa Civil, as argumentações usadas por Barbosa "cerceiam a liberdade de expressão" e "são uma tentativa de constranger e censurar" os réus.
O advogado de Dirceu, José Luis Oliveira Lima, também informou por nota que o passaporte do ex-ministro será entregue hoje. Porém, também considerou a ordem de Barbosa equivocada.
"Criticar uma decisão não significa desrespeitar o Poder Judiciário. Vivemos em um país livre, numa democracia, onde a liberdade de expressão é a regra e faz parte do Estado Democrático de Direito", apontou.
ENTREGA
Segundo Barbosa, a medida foi necessária porque considera que alguns réus adotaram "comportamento incompatível com a condição de condenados e com o respeito que deveriam demonstrar para com órgãos jurisdicionais perante o qual respondem por acusações de rara gravidade".
"Na fase que se encontra o julgamento, parece-me inteiramente inapropriada qualquer viagem ao exterior por parte dos réus já condenados, sem conhecimento do Supremo", completou.
Barbosa se referia ao ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato e ao ex-deputado Romeu Queiroz (ex-PTB, hoje PSB). O primeiro ficou fora do país por apenas um período, alegando que estava resolvendo um problema pessoal, mas sua ausência causou apreensão no Ministério Público. Já Queiroz ficou sete dias em Curaçau, no Caribe.
Veja a íntegra da nota de Dirceu:
O que justifica?
A decisão do relator Joaquim Barbosa de apreender os passaportes dos réus da Ação Penal 470 é puro populismo jurídico e uma séria violação aos direitos dos réus ainda não condenados, uma vez que o julgamento não acabou e a sentença não transitou em julgado. Cabem recursos mesmo após a publicação do acórdão. Mostra-se também exagerada porque todos os réus estão presentes por meio de seus advogados legalmente constituídos e em nenhum momento obstruíram ou deixaram de atender as exigências legais.
Mas o mais grave são os argumentos para tal decisão, alegando que os réus adotaram comportamento incompatível e desrespeitoso com o Supremo. O ministro sustenta o pedido de recolhimento dos passaportes porque dois réus - antes de serem condenados - viajaram para o exterior e voltaram normalmente. Afirmou ainda em seu despacho que alguns réus "deram a impressão de serem pessoas fora do alcance da lei" com atitudes que afrontariam o Supremo Tribunal Federal.
Ou seja, os argumentos cerceiam a liberdade de expressão e são uma tentativa de constranger e censurar, como se os réus não pudessem se defender e, mesmo condenados, continuarem a luta pela revisão de suas sentenças.
É importante ressaltar que eu nunca me manifestei sobre o mérito dos votos dos ministros ou sobre a legitimidade e o respeito à corte. Sempre respeitei as decisões do Supremo Tribunal Federal, uma vez que lutei pela nossa democracia, mesmo com risco à minha própria vida.
Nada vai me impedir de me defender em todos os foros jurídicos e instituições políticas. Mesmo condenado e apenado, não abro mão de meus direitos e garantias individuais - do direito de me expressar e contraditar o julgamento e minha condenação.
Nenhum ministro encarna o Poder Judiciário - não estamos no absolutismo real. Nenhum ministro encarna a nação ou o povo - não estamos numa ditadura. Mesmo acatando a decisão, tenho o direito de me expressar diante de uma tentativa de intimidar os réus, cercear o direito de defesa e expor os demais ministros ao clamor popular instigado, via holofotes de certa mídia, nestes quase quatro meses de julgamento.
Decisões judiciais devem ser respeitadas e cumpridas, mas isso não quer dizer que não podem ser contestadas, quer pelo acusado, quer pela defesa técnica. Criticar uma decisão não significa desrespeitar o Poder Judiciário. Vivemos em um país livre, numa democracia, onde a liberdade de expressão é a regra e faz parte do Estado Democrático de Direito. O passaporte do meu cliente será entregue hoje, informou o advogado do ex-ministro. (Folha). Foto: Avener Prado/Folhapress
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