O presidente Donald Trump admitiu pela primeira vez estar envolvido no pagamento de US$ 130 mil (aproximadamente R$ 460 mil) feito por seu advogado pessoal à atriz pornô Stormy Daniels, que diz ter tido um caso com ele e recebido dinheiro para se calar.
Trump sustentava até então desconhecer qualquer operação financeira para garantir o silêncio de Daniels, mas - pegando emprestado uma frase do secretário de imprensa do governo de Richard Nixon, Ron Ziegler - parece que tal afirmação "não está mais operacional".
O novo argumento do presidente e sua equipe jurídica é de que ele reembolsou seu advogado, Michael Cohen, por ter feito o pagamento a Daniels como forma de impedi-la de fazer "acusações falsas e extorsivas" sobre uma suposta ligação sexual entre os dois.
Mas se Trump e seus advogados seguirem essa linha de argumentação, levantar-se-á a seguinte questão - e não importa a resposta, os problemas do presidente estarão longe de terminar.
E a questão é: se Daniels está mentindo, por que pagar US$ 130 mil para silenciá-la?
Há três respostas possíveis.
Resposta 1: Ela não está mentindo. O episódio do quarto do hotel, ou algo parecido, aconteceu.
Stormy Daniels, como é conhecida a atriz pornô Stephanie Clifford, afirmou ter tido um caso com o republicano em 2006, ter assinado um acordo garantindo que ficaria em silêncio sobre isso e que recebeu, para esse fim, US$ 130 mil nos últimos dias da campanha presidencial em 2016, da qual Trump saiu vitorioso.
Daniels também afirmou ter aceitado esse acerto porque temia por sua segurança e a de sua filha, já que teria recebido uma ameaça em 2011, quando uma reportagem sobre o caso dos dois estava para ser publicada.
A hipótese de ela estar falando a verdade sobre o que aconteceu no hotel, ou algo próximo disso, é provavelmente a mais palpável.
O presidente e a secretária de imprensa da Casa Branca, Sarah Huckabee Sanders, recuaram de afirmações de que Trump não tinha conhecimento do pagamento, por isso, muito questionam a credibilidade de seus desmentidos sobre o encontro em si.
É claro que novas admissões teriam um custo político, mas muitos americanos já tinham ouvido falar no assunto em 2011 e mesmo assim votaram para elegê-lo presidente.
Em 1998, Bill Clinton admitiu ter mentido sobre seu caso com a estagiária da Casa Branca Mônica Lewinsky, mas isso teve pouco impacto sobre seus índices de aprovação geral, que na época eram muito mais altos do que os números atuais de Trump.
Além do que, o advogado de Daniels insinuou que há provas do encontro, ou seja, existe a chance de que Trump seja obrigado a seguir o caminho de Clinton.
Resposta 2: Ela está mentindo, mas a acusação teria sido tão prejudicial para a campanha presidencial de Trump que teve que ser silenciada.
O ex-prefeito da cidade de Nova York, Rudy Giuliani, contratado recentemente para ser advogado pessoal de Trump, tentou variações dessa explicação nas horas que se seguiram à revelação de que o presidente reembolsou Cohen pelo pagamento de seis dígitos a Daniels.
"Imagine se isso tivesse vindo a público em 15 de outubro de 2016, no meio do último debate com Hillary Clinton", disse ele no programa de TV a cabo Fox & Friends na manhã de quinta-feira. "Cohen nem mesmo perguntou (se deveria fazer). Ele simplesmente fez (a história) desaparecer".
O problema é que isso equivale à admissão de que as ações de Cohen foram tomadas para proteger a campanha presidencial de Trump. Mesmo se Cohen fosse posteriormente reembolsado pelo presidente, o pagamento feito por ele constitui um empréstimo para a campanha - que a lei exige que seja declarado nos registros da Comissão Eleitoral Federal.
Em 2011, o ex-candidato democrata à vice-presidência John Edwards foi alvo de múltiplas acusações de fraude por usar recursos provenientes de doações políticas para ajudar a esconder um caso extraconjugal que teve com uma videomaker de sua campanha.
Embora os procedimentos legais relacionados ao episódio tenham terminado com um júri suspenso, o caso é exemplo de como supostas violações da lei de campanha podem se tornar um sério problema legal.
Resposta 3: Ela está mentindo, mas "celebridades e pessoas ricas" fazem esse tipo de pagamento o tempo todo para evitar situações desagradáveis.
No segundo de três tuítes que postou relacionados a Daniels na manhã de quinta-feira, o presidente insinuou que pagamentos não divulgados - mesmo para mentirosos e chantagistas - fazem parte do fardo de ser rico e/ou famoso.
Se Trump, através de Cohen, tivesse feito vários pagamentos desse tipo, e não apenas a Daniels, para evitar revelações prejudiciais na véspera da eleição presidencial, talvez esse argumento pudesse evitar potenciais violações da lei de financiamento de campanha.
Parte do desafio de decifrar a estratégia legal do presidente nos últimos dias é que Giuliani ofereceu explicações diversas, e às vezes contraditórias, sobre por que o pagamento foi feito.
Na mesma entrevista à Fox & Friends, em que o ex-prefeito falou sobre como a história de Daniels poderia ter sido prejudicial à campanha de Trump, ele disse que o pagamento foi feito para "salvar" o casamento de Trump com Melania.
"O presidente foi ferido pessoalmente, não politicamente. Foi pessoalmente, bastante, assim como a primeira-dama, por algumas das falsas acusações", disse Giuliani.
Ele acrescentou que o pagamento de US$ 130 mil, para um homem como Trump, "não era lá grande coisa".
"Parece muito dinheiro", disse ele. "Mas não é quando você está colocando US$ 100 milhões em sua campanha. Não é uma mixaria, mas está bem perto disso no final."
Este tipo de defesa pode ter, no entanto, o seu próprio preço político. Simpatizantes do presidente podem não gostar de ouvir seus advogados descreverem como "mixaria" o que corresponderia a vários anos de seus salários.
Muitos aliados do presidente fizeram duras críticas à líder da minoria democrata na Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, quando ela chamou os benefícios que a população de baixa renda obteria do corte de impostos republicano de "migalhas". E Giuliani pode ter acabado de dar aos democratas um poderoso contra-argumento.
Ao considerar as outras opções, no entanto, o impacto do "não é lá grande coisa" pode ser o menos prejudicial.
BBC Brasil Foto: Getty Images
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