Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o homem que chefiou a pasta da Justiça antes da queda de Dilma detalhou o clima que reinava no Planalto e na Esplanada.
"Olha, foi uma experiência muito rica e ao mesmo tempo extremamente dolorosa."
É o que diz Eugênio Aragão, ministro da Justiça do Brasil entre 14 de março e 12 de maio de 2016, sobre o segundo mandato do governo de Dilma Rousseff.
Segundo Aragão, "os dados já tinham caído" na época da sua chegada à Esplanada dos Ministérios. Os "dados" são aqueles da crise política, sendo o julgamento do impeachment de Dilma Rousseff "uma questão de tempo".Houve inclusive tensão na família do ministro:
"Até me lembro de que na época, a minha esposa chegou meio nervosa e disse: 'Agora você vai assumir este compromisso e eu perdi o meu marido'. Eu disse: 'Calma, calma, isso não vai ser mais do que dois meses'."
Parecia um pulo "de paraquedas dentro de uma fogueira" e os colegas apelavam: "Não entre nessa. Isso é fria", conta Aragão.
Contudo, o ex-ministro afirma que a sua atuação no ministério foi parte de um esforço importante para salvar o sistema constitucional brasileiro:
"Nada é ruim quando você acredita. Eu digo com toda sinceridade, que eu faria de novo. Mesmo sabendo de tudo que veio, eu acho que, todo o esforço para a gente manter a integridade do nosso sistema constitucional, a integridade do mandato de uma presidente eleita. Todo esforço é pouco e acho que valeu a pena."
Sim, o ministro, que acompanhou os últimos dois meses do governo de Dilma Rousseff, afirma que o final da história era bastante previsível. Ou, pelo menos, o início do fim, pois a presidente, primeiro, foi afastada temporariamente, levando seu vice, Michel Temer, à cadeira da presidência na importância de presidente interino. Contudo, em março e abril, a presidente não chegou a admitir a possibilidade de ser deposta nem no círculo ministerial. "Não, naquela época, no início, não", ressalta Aragão. Mas reconhece que houve crise no governo, agravada pela "bala perdida" da Lava Jato e pelos entraves montados no âmbito legislativo:
"Foi afinal das contas, foram 14 meses de profunda crise política, uma crise econômica que veio a reboque da crise política porque todas as medidas, que o governo deveria implementar para enfrentar a crise, eram sistematicamente sabotadas pelo Congresso. Leia-se, por Eduardo Cunha!"
A crise política começou logo no final de outubro de 2014, quando Dilma Rouseff foi reeleita, gerando uma onda de protesto e desespero entre os seus opositores. Esses estavam também no Tribunal Superior Eleitoral, o TSE. O clima no TSE na hora da contagem dos votos foi "a base de uísque" e de alegria, no aguardo da vitória de Aécio Neves, do PSDB. Mas depois, quando apareceram os resultados finais, a ressaca bateu. A cena descrita por Eugênio Aragão expõe um Brasil em transe político:
"Aos 14 minutos de chegar o definitivo, nós vemos um Merval [Pereira] na Globo com cara de quem comeu e não gostou olhando lá, dizendo assim 'Não, isso não é possível, isso não é possível'. E depois verificou-se que era exatamente o momento que deu-se a virada. Até então, até essa virada, a oposição da época, o PSDB e os seus apoiantes e apoiadores, estava já em festa. Paulinho da Força tinha convidado a Vai-Vai para sambar na Paulista. Os políticos do PSDB da oposição, todos estavam em revoada para Belo Horizonte. Estava todo mundo achando mais que natural e via-se a alegria entre muitos ministros do TSE, todos sorridentes, felizes. E aí de uma hora para outra, quando veio o resultado final, evidenciou-se uma cara de funeral de todo o mundo, de velório. E inclusive teve um deles, que não quero citar nomes, um deles que se levantou e disse assim 'eu não tenho nada para festejar hoje, até logo'. Isso daqui dito por magistrados, exemplos, que julgam uma eleição. Ali, havia claramente uma cara de insatisfação, quase de indignação, pelo resultado estreito que a presidente conseguiu lograr. E no dia seguinte, de imediato, começa um zum-zum-zum pelo deputado Carlos Sampaio de que iam pedir uma recontagem dos votos. Foi uma estratégia evidentemente errada porque, com isso, eles não chutaram na canela da presidente Dilma, e sim na canela do ministro Toffoli, que era presidente do Tribunal. Estavam dizendo que o Tribunal tinha melado as eleições. Como é que é isso?"Vale lembrar que Dilma Rousseff foi definitivamente afastada do seu cargo de presidente da República em 31 de agosto de 2016. (Sputnik) (NM) Foto: Reuters
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